Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes nasceu em Salvador, em 1914. Ela foi a segunda a nascer, dos cinco filhos do dentista e advogado Augusto Lopes Pontes. Ele mantinha uma escola para pessoas carentes, e seu maior gosto era a dedicação às entidades assistenciais. Sua mãe se chamava Dulce Maria de Souza Brito Lopes Pontes, e morreu aos 26 anos de idade.
Ao visitar algumas áreas carentes de Salvador, acompanhada por uma tia, Maria Rita manifestou o desejo de se dedicar à vida religiosa. Tentou entrar para o Convento do Desterro, porém, foi recusada, em virtude de ser muito jovem. Tinha somente 13 anos. No entanto, preocupada com a miséria reinante, transformou a casa da família em centro de atendimento, e passou a atender mendigos e doentes, fazendo curativos e cortando os seus cabelos.
Quando concluiu o magistério, aos 18 anos, o pai perguntou-lhe o que gostaria de ganhar como presente de formatura. Surpreso, ele ouviu a resposta:
- Não quero nada, só quero que o senhor me deixe ser freira.
Dele, e da irmã, Dulcinha, Maria Rita recebeu muito apoio. Contudo, a família não imaginava que aquela mocinha, aparentemente tão frágil, iria se transformar em uma fortaleza e um raro exemplo de bondade e amor ao próximo.
Ela viajou para a cidade de São Cristóvão, em Sergipe, e entrou na Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição. Lá, aos 20 anos de idade, após um período de seis meses de noviciado, ela foi ordenada freira, e passou a se chamar Irmã Dulce, em homenagem à sua mãe. Era o dia 15 de agosto de 1934.
De volta a Salvador, trabalhou como enfermeira voluntária e professora de geografia. Mas, achando que não tinha vocação para lecionar, resolveu se dedicar ao trabalho social nas ruas, e à evangelização junto aos bairros operários de Salvador.
Aos domingos, ela se dirigia às favelas dos Alagados - um antigo mangue, aterrado com lixo e cheio de barracos - e de Itapagipe, na Cidade Baixa, para socorrer os necessitados, e foi nessas áreas que se concentraram suas principais atividades e obras sociais. Irmã Dulce tocava sanfona, animava o almoço dos operários e lhes ensinava o catecismo. Ao verificar que eles não possuíam qualquer direito trabalhista e, tampouco, tinham assistência médica, ela convocou uma reunião. O primeiro encontro contou com a presença de quatro homens e seis mulheres. A religiosa pensou em desistir. Porém, no segundo encontro, duzentas pessoas estiveram presentes. Irmã Dulce construiu, na área, uma farmácia, um posto médico e uma cooperativa de consumo. Para tanto, foi atrás de donativos, falou com empresários e, no final, conseguiu atingir seu objetivo.
Para alimentar tantos pobres, de manhã, ela saía com uma caminhonete e percorria feiras e supermercados, onde os comerciantes já a esperavam com algum saco de verdura, um pouco de cereal, ou qualquer outro produto que pudessem ou quisessem doar. O importante era não voltar de mãos vazias.
Tinha desejo de fundar um movimento operário, que oferecesse assistência material e religiosa às pessoas carentes. Com esse objetivo, ela juntou-se, mais tarde, a um grupo de operários, que era coordenado pelo frade alemão Hildebrando Kruthaup. Os dois grupos se fundiram e, em 10 de janeiro de 1937, surgiu a União Operária de São Francisco (UOSF), o primeiro Movimento Cristão Operário de Salvador. A instituição se mantinha com a arrecadação advinda de três cinemas, que os religiosos construíram com doações.
Posteriormente, ela fundou o Círculo Operário da Bahia, que proporcionava atividades culturais e recreativas aos trabalhadores e familiares; fundou também uma escola de ofício; e criou, em 1939, o Colégio Santo Antônio, uma instituição pública de ensino para os operários e suas famílias.
Chamada de Irmã Dulce dos Pobres, ela ocupou um barracão abandonado, na década de 1950, na Ilha dos Ratos, com doentes, idosos, mulheres, crianças e jovens, e deu início à sua obra assistencialista. Contudo, o prefeito de Salvador ordenou que todos se retirassem dali. Sem mais opções, a religiosa conversou com a madre superiora, e ela permitiu que o galinheiro do convento de Santo Antônio fosse transformado em albergue para os pobres. Quando foi parabenizá-la pelo trabalho realizado, a madre perguntou sobre o destino de suas galinhas. Com bastante calma, Irmã Dulce, apontou para um dos doentes e respondeu: elas viraram canja e estão na barriga deles. Esse foi o marco inicial de uma das obras sociais mais grandiosas existentes no país. O convento, mais tarde, deu origem ao Hospital Santo Antônio, um centro médico, social e educacional que, ainda hoje, atende aos pobres.
Irmã Dulce não lia jornais, não via televisão, quase não comia e pouco dormia. Três vezes por semana, jejuava. Suas refeições se resumiam a um pouquinho de arroz e legumes, que cabiam em um prato de sobremesa. Carnes, doces e refrigerantes não faziam parte de seu cardápio. Ela dormia, no máximo, quatro horas por noite, sentada em uma cadeira de madeira maciça. Agia assim para pagar uma promessa que fez, mas findou dormindo na espreguiçadeira durante trinta anos. Só interrompeu o costume quando os médicos a proibiram. Seus sacrifícios, porém, eram proporcionais à felicidade que sentia.
Em 1952, um grande barulho assustou as freiras do convento. Quando Irmã Dulce correu até a janela, ainda pôde ver a explosão: um ônibus e um bonde haviam colidido. Antes que o socorro chegasse ao local, ela puxou uma mangueira, subiu num caixote, quebrou a janela dianteira do ônibus e, com o hábito chamuscado, conseguiu salvar doze passageiros. Dezesseis pessoas, entretanto, morreram queimadas no acidente.
Mesmo com a saúde frágil, ela construiu e manteve uma das maiores e mais respeitadas instituições filantrópicas do país. Os baianos consideravam-na um "Anjo bom". Ela era tão respeitada e amada que, na década de 1980, o papa João Paulo II, na visita ao Brasil, fez questão de visitá-la e conhecer sua obra.
A religiosa fundou outros estabelecimentos. Dentre eles, um orfanato, o Centro Educacional Santo Antônio, em Salvador, que abriga mais de trezentas crianças e jovens, com idades de três a dezessete anos. Este Centro oferece cursos profissionalizantes, e lá são cultivadas verduras e legumes para o próprio consumo. Ela inaugurou um asilo, o Centro Geriátrico Júlia Magalhães; e fundou o Hospital Santo Antônio, no convento de mesmo nome. Irmã Dulce pedia doações em gabinetes de governadores, prefeitos, secretários e presidentes da República, sempre com a mesma determinação.
Acometida por graves problemas de saúde - tinha somente 30% da capacidade respiratória - foi internada, em 1990, e passou por diversos hospitais. Quando os médicos lhe perguntavam como havia passado à noite, ela dizia: passei na boate. Ela chamava de boate o tubo de oxigênio que a mantinha viva.
Na segunda visita de João Paulo II ao Brasil, Irmã Dulce e o papa, em 20 de outubro de 1991, voltaram a se encontrar no Convento Santo Antônio. Mas, ela já estava muito doente. Depois de dezesseis meses de agonia, a religiosa solicitou: Quero morrer ao lado dos pobres. Ela faleceu no Convento Santo Antônio, no dia 13 março de 1992. Seu velório, na Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, congregou políticos, empresários, artistas, operários, milhares de pessoas de todas as camadas sociais. A religiosa foi sepultada no altar do Santo Cristo, na Basílica de Nossa Senhora da Conceição da Praia.
O Hospital Santo Antônio, fundado por ela em 1970, e ampliado em 1983, hoje recebe verbas regulares do Governo Federal, mas as doações continuam sendo imprescindíveis. A instituição possui 1,1 mil leitos e atende, diariamente, a quatro mil pessoas.
O Memorial Irmã Dulce (MID), em Salvador, inaugurado em 1993, mantém uma exposição permanente sobre a vida e a obra da freira baiana, e recebe cerca de vinte mil visitantes por ano. Ele está localizado em um prédio anexo ao Convento Santo Antônio, no bairro de Roma, e faz parte do roteiro turístico oficial da capital baiana. Numa decisão da Diretoria da Bahitursa, empresa de turismo do Governo do Estado. O memorial expõe nove mil itens, entre o hábito usado pela religiosa, fotografias, documentos, maquetes e livros. A instituição preservou, ainda, da forma como foi deixado, o quarto onde Irmã Dulce dormiu, em uma espreguiçadeira, durante mais de trinta anos.
No ano 2000, ela foi distinguida, pelo papa, com o título de “Serva de Deus”. Mais recentemente, foi reconhecida pelo Vaticano como “Venerável”. E, o processo de sua beatificação está em tramitação, na Congregação das Causas dos Santos.
Independentemente da decisão que o Vaticano possa tomar, a Irmã Dulce dos Pobres permanecerá sempre no imaginário dos baianos como o “Anjo Bom”, que abriu as asas, protegeu os necessitados e, ao lado deles, voou rumo ao Eterno.
Fontes consultadas:
CONGREGAÇÃO do Vaticano reconhece Irmã Dulce como venerável.
Disponível em:
DE serva a “venerável”. Fala, Brasil. Época, São Paulo, n. 558, p. 17, jan. 2009.
INSTITUTO Irmã Dulce da Bahia. Disponível em:
Acesso em: 27 jan. 2009.
IRMÃ Dulce. Disponível em:
IRMÃ Dulce. Disponível em:
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IRMÃ Dulce entra na fila do Vaticano para virar santa. Disponível em:
Acesso em: 27 jan. 2009.
MEMORIAL Irmã Dulce é incluído no roteiro turístico religioso de Salvador. Disponível em: http://minhanoticia.ig.com.br/editoria/Turismo/2008/04/02/memorial_irma
_dulce_e_incluido_no_roteiro_turistico_religioso_de_salvador_2074759.html>. Acesso em: 27 jan. 2009.
SCHUMAHER, Schuma; BRAZIL, Erico Vital (Org.). Dicionário mulheres do Brasil: de 1500 até a atualidade. Rio de Janeiro: Zahar, 2000
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