quarta-feira, 20 de maio de 2009

MANEZINHO ARAÚJO

MANEZINHO ARAÚJO

Semira Adler Vainsencher
semiraadler@gmail.com
Pesquisadora da Fundação Joaquim Nabuco


Na cidade do Cabo, em Pernambuco, no dia 27 de setembro de 1910, nascia Manuel Pereira de Araújo, conhecido como Manezinho Araújo. Era filho de Joventina Pereira de Araújo e de José Brasilino de Araújo, um funcionário que trabalhou durante quarenta anos na Companhia Great Western.

A infância de Manezinho foi passada no bairro de Casa Amarela, no Recife. Ainda adolescente, ele iria conhecer Minona Carneiro - um grande cantador de emboladas que foi seu professor e incentivador - e, através dele, veio a se apaixonar pela música. Manezinho Araújo seria um dos maiores divulgadores e intérpretes da embolada.

Mas, o que vem a ser a embolada? Trata-se de uma das formas mais originais das músicas do folclore do Nordeste do Brasil. De maneira humorística, o embolador discorre sobre pessoas, fatos, contando vantagens como se fosse um cronista. Alguns consideram que a embolada tem sua origem na literatura de cordel e, à ela, está sempre relacionada.

Em 1930, Manezinho ingressava como soldado no exército revolucionário. Quando o seu pelotão chegou à Bahia, porém, o governo havia se rendido e a tropa, a título de prêmio, ganhou uma viagem para o Rio de Janeiro e viria a se tornar sargento. No Rio, entretanto, ele chegou a passar fome e, para poder sobreviver, cantava em cabarés.

Por sorte, ele conheceu alguns músicos e começou a se apresentar em programas de rádio, como cantador de emboladas. Manezinho era escalado, então, para cantar na Rádio Mayrink Veiga, às segundas e sextas-feiras, e se apresentar em vários Estados. Com o passar do tempo, ficava conhecido como "o rei da embolada".

O primeiro artista brasileiro a gravar jingles comerciais para empresas importantes, e ser contratado para fazer a propaganda de produtos industrializados foi Manezinho Araújo. Neste sentido, ele participou da campanha dos produtos Lifeboy, e foi contratado por uma fábrica - a do Óleo de Peroba. Depois disso, recebeu um convite de Ademar Casé, para cantar duas vezes por semana na Rádio Phillips.

Como era muito hospitaleiro, o compositor teve a idéia de montar um restaurante - o Cabeça Chata - cujos quitutes eram elaborados por sua esposa Alaíde - a dona Lalá. Manezinho Araújo costumava cantar para entreter os fregueses.

O seu restaurante chegou a ser freqüentado, inclusive, por inúmeras personalidades nacionais e internacionais, tais como Edith Piaff, Yul Brinner, Carmen Miranda, Villa-Lobos, Cacilda Becker, Raquel de Queiroz, entre tantos outros. A comida mais apreciada no local era o bobó de camarão de dona Lalá.

Vale salientar que, do final de 1930 até a década de 1950, Manezinho gravou mais de 50 discos 78 rpms e quatro LPs. Suas composições foram gravadas, ainda, por vários cantores brasileiros. Com a Odeon, em especial, ele teve um contrato de oito anos.

No Rio de Janeiro, além de boates e cassinos, Manezinho trabalhou nas rádios Tupi, Guanabara e Mayrink Veiga. Quando foi morar em São Paulo, ele ingressou na Record.

Pode-se afirmar que o interesse dos sulistas pelo folclore e músicas nordestinas se deve a Manezinho Araújo, que participou, também, de vários filmes brasileiros (seja cantando emboladas ou contando um caso), bem como de 22 cinejornais da Atlântida. Em 1945, quando gravou o calango Dezessete e setecentos, de autoria de Luís Gonzaga e Miguel Lima, o compositor obteve muito sucesso.

Manezinho Araújo também atuou como jornalista no rádio e na imprensa, escrevendo na Revista do Rádio a coluna Rua do Pimenta.

Algumas de suas músicas com Fernando Lobo foram Cuma é o nome dele?, Maria roxa, Pra onde vai valente?, De jeito nenhum, Ai, ai, ui, ui, Carrité do coroné, Vatapá, Amô de rede, Tamanqueiro, Palmatória e Vapô de caragola. Com Ismael Neto, Manezinho compôs Suspiro que vai e vem; com Hervê Clodovil, Rua do sol, Tem dó e A saudade é de matar; e, com Carvalinho, Ele.

Além dessas músicas, Manezinho Araújo compôs Ai, cachaça!, A nêga do doce, Não sei a hora, Como tem Zé na Paraíba, Na base da chinela, Não entendo essa mulher, Quadro negro e Baião do bambolê.

Em 1954, aos 44 anos de idade, o compositor abandonava a música dizendo que havia "pendurado as chuteiras". Como despedida, realizou um grande espetáculo no Tijuca Tênis Clube.

Manezinho, entretanto, por se tratar de um ser polivalente e especial, passou a se dedicar à pintura no início da década de 1960. Tudo começou quando a sua esposa adquiriu uma gravura inglesa para enfeitar a casa. Manezinho olhou para o quadro e falou: "Melhor do que isso eu faço!" Ao que dona Lalá respondeu na hora: "Então faça!".

O grande desafio estava lançado. Autodidata, e dizendo-se "ceguinho em técnica", Manezinho começou com aquarela e guache, sem orientação alguma, e culminou pintando com tinta a óleo, quando sua esposa lhe presenteou com um conjunto de tintas, por ocasião do seu aniversário. Em estilo primitivo puro, o artista passava para as telas cenas da infância, da juventude e da maturidade, retratando as raízes do Nordeste do Brasil. Ele pintava cidades, paisagens, palafitas, barqueiros, marinhas, pescadores e baianas.

Então, de cantor famoso, Manezinho Araújo veio a se tornar um dos artistas mais conceituados do Brasil, em se tratando do estilo primitivo. Ele realizou mais de trinta exposições e os seus quadros sempre foram bem vendidos. Algumas de suas pinturas se encontram em museus regionais, como o de São Luís (MA), o de Araxá (MG), de Feira de Santana (BA). Duas telas do autor, inclusive, estão expostas no museu da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, Portugal.

Manezinho Araújo faleceu em São Paulo, no dia 23 de maio de 1993.


Fontes consultadas:

ACERVO da Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco, até 2003.

LUCCA JÚNIOR, Domingos de. As três artes de Manezinho Araújo. City News, São Paulo, ano 12, n. 636, 20 dez. 1977. Cidade em Notícias, p. 72.

MANEZINHO Araújo (Manuel Pereira de Araújo). [S.n. t.]. Acervo da Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco. (mimeografado)

MANEZINHO Araújo, profissão artista. Diario de Pernambuco, Recife, 31 maio 1981. Viver, secção B, p. 1.

MARCONDES, Marcos Antônio (Org.). Enciclopédia da música brasileira: erudita, folclórica e popular. 2. ed. São Paulo: Art Editora, 1998.

MARCONI, Celso. Manezinho Araújo, ladrão de purezas. Jornal do Commercio, Recife, 31 maio 1981. Artes plásticas, p. 3.

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