No dia 8 de agosto de 1850, nasce José Mariano Carneiro da Cunha, na casa-grande do engenho Caxangá, distrito de Ribeirão, na época pertencente ao município de Gameleira. O ambiente de engenhos e canaviais, bem como a estrutura das casas-grandes e das senzalas, em muito o influenciaram. Vem morar no Recife, ingressa na Faculdade de Direito e se forma em 1870, na mesma turma de Joaquim Nabuco. Nesse contexto, além disso, trava conhecimento com Rui Barbosa, e identifica-se logo com o movimento abolicionista, que se alastra entre as camadas populares e meios intelectuais e políticos. Ele passa a colaborar, então, em jornais, revistas e várias agremiações.
No Recife, José Mariano funda o jornal A Província, que representou um instrumento combativo, defendeu acirradamente a libertação dos escravos, e muito influenciou a opinião pública. O primeiro número do jornal sai no dia 6 de setembro de 1872, cerca de ano depois de assinada a Lei do Ventre Livre (Lei de Rio Branco).
Assim como Joaquim Nabuco, Barros Sobrinho, João Ramos, Alfredo Pinto, Phaelante da Câmara, Vicente do Café e Leonor Porto, José Mariano era membro da associação emancipatória Clube do Cupim, fundado em 1884, que alforriava, defendia e protegia os escravos. Leonor Porto, por sua vez, funda e preside uma outra associação: a Aves Libertas. E as Ordens Religiosas - em particular, os beneditinos - também costumavam libertar os seus escravos, desde 1870.
Naquela época, uma pessoa de grande importância na comunidade é a esposa de José Mariano, a recifense Olegaria da Costa Gama. Pela sua bondade e dedicação aos escravos, é apelidada de "mãe dos pobres" e "mãe do povo". Olegaria sempre apoiava os escravos fugidos, roubados das senzalas, ou alforriados. Muitos deles fugiam em barcaças carregadas de capim e ramagens, as quais passavam defronte da Chefatura de Polícia, na rua da Aurora.
Mesmo quando José Mariano foi preso, sofreu inúmeras humilhações e torturas terríveis, D. Olegarinha continuou lutando em prol da abolição da escravatura. Inclusive, empenhando as próprias jóias para financiar as despesas referentes à eleição de Joaquim Nabuco - colega abolicionista - em 1887, ao cargo de deputado-geral.
José Mariano é considerado um orador comunicativo, um abolicionista corajoso, e um dos homens públicos que mais desfrutavam da simpatia popular em Pernambuco. Mesmo quando estava separado do povo e preso, demonstrava suas tendências abolicionistas e republicanas. Possuía atitudes corajosas e o seu nome representava uma bandeira. Conseguiu ser eleito deputado em 1886, mas a eleição é impugnada e José Mariano perde a cadeira.
No dia 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel assina a Lei Áurea que declara extinta a escravidão no Brasil. Junto à opinião pública nacional, consagram-se os líderes da campanha redentora: Joaquim Nabuco, José Mariano, José do Patrocínio, André Rebouças. Pouco mais de um ano depois, a República é proclamada pelo Marechal Deodoro da Fonseca, em 15 de novembro de 1889. A gestão de Deodoro dura somente dois anos, porém: este renuncia e o chamado Marechal de Ferro - o Marechal Floriano Peixoto - assume a Presidência da República.
O nome de José Mariano figura entre os deputados à Constituinte, em 1890, e, em 1891, ele é eleito Prefeito do Recife. Pouco tempo depois, Alexandre José Barbosa Lima - considerado um autoritarista e florianista - assume o Governo de Pernambuco. José Mariano lança-se de imediato em sua oposição, publicando uma série de artigos contra o Marechal Floriano Peixoto. Em decorrência disto, ele foi preso em sua residência (no Poço da Panela), e trancafiado na fortaleza do Brum, sob a acusação de pactuar com a revolta da Armada.
José Mariano consegue ser libertado do calabouço, no entanto, e assume a cadeira de deputado. A população do Recife gosta muito dele. Todas as ruas e casas, desde o cais do porto, até o Poço da Panela, ficaram ornamentadas e embandeiradas para saudar o retorno do abolicionista. Na época, inclusive, ele fez um discurso célebre na Câmara, com cinco horas de duração, narrando o martírio vivenciado como prisioneiro.
Mas o clima geral era de muitos conflitos políticos. Nesse contexto, foi covardemente assassinado o famoso jornalista político José Maria de Albuquerque Melo, na rua 24 de Maio, enquanto visitava uma seção eleitoral e protestava contra ilegalidades praticadas pelo presidente da mesa, o chamado Major Pataca. O mesmo dispara vários tiros contra o jornalista e, como não lhe foi permitido o socorro médico, José Maria vem a falecer pouco depois. O incidente abala muito o Recife e repercute em todo o País. De imediato, José Mariano escreve um artigo sobre o assunto, intitulado A tragédia de Pernambuco, que sai publicado no Jornal do Comércio do Rio.
No dia 24 de abril de 1898, em decorrência das complicações de uma gripe, morre dona Olegarinha, a amada esposa de José Mariano. Ele se achava no Rio de Janeiro e sequer pode assistir aos funerais prestados pela população pernambucana. Esta, que a divinizava, se condoeu muito com o fato. Fala-se que foram muitos os pretos que se suicidaram, envenenando-se ou jogando-se no rio Capibaribe. E a chamada Mãe dos Pobres teve um enterro solene.
Após tal dolorosa perda, José Mariano se afasta das lutas políticas. Em 1899, ele é nomeado Oficial do Registro de Títulos, pelo Presidente Rodrigues Alves, e também é presenteado com um Cartório de Títulos e Documentos, na rua do Rosário, no Rio de Janeiro.
Infelizmente, não muito tempo depois, José Mariano Carneiro da Cunha adoece e vem a falecer no dia 8 de junho de 1912. Às expensas do Estado, o navio Ceará transportou o seu corpo embalsamado para o Recife. No Estado, foi decretado luto por três dias, e houve uma comoção geral em seu enterro. As pessoas jogavam flores em seu esquife e muitas choravam. Para homenagear esse ilustre abolicionista pernambucano, o periódico A Lanceta publica alguns versos, em sua edição de 12 de junho de 1912, que terminam assim:
Chore...chore o Brasil sua grande desdita.
Porque o cedro tombou!
Foi erigida em sua homenagem, posteriormente, uma estátua no Poço da Panela, e deram o seu nome, ainda, ao cais que ladeia uma das margens do rio Capibaribe, no centro do Recife: o Cais José Mariano. Seus contemporâneos, contudo, sempre desejaram que ele fosse lembrado como um excelente orador popular, um grande abolicionista e republicano, e, principalmente, um pernambucano que deu tudo de si ao próximo e à Pátria.
Fontes consultadas:
SILVA, Jorge Fernandes da. Vidas que não morrem. Recife: Secretaria de Educação, Departamento de Cultura, 1982.
PARAHYM, Orlando. José Mariano. Recife: Dialgraf, 1976.
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